Gazeta de Alagoas
Pesquise na Gazeta
Maceió,
Nº 0
Opinião

UMA SEGUNDA CHANCE

.

Por Marcos Davi Melo. médico e membro da AAL e do IHGAL | Edição do dia 11/07/2020

Matéria atualizada em 11/07/2020 às 06h00

A pandemia de Covid-19 ultrapassa os 70 mil óbitos no Brasil e repetem-se as tragédias, entre as quais a dor cruel dos que perderam seus entes queridos e não puderam (nem podem) render-lhes as últimas homenagens, não se despediram deles, não conseguiram proceder ao tradicional ritual do luto, um pálido consolo que torna as perdas dos entes queridos minimamente suportáveis. Tudo que gostariam é de ter uma segunda chance para deixar fluir suas legítimas saudades junto aos que partiram.

A confirmação da doença no presidente da República não surpreendeu ninguém, pois ele vinha frequentando manifestações e aglomerações públicas sem usar máscaras, submetendo-se e submetendo as pessoas a contrair a enfermidade. Ao anunciar estar infectado, o fez em público e próximo aos repórteres, dando em seguida uma entrevista amolecada, fazendo marketing da cloroquina para toda a população, uma droga que, segundo as autoridades mundiais da saúde, como a FDA, a OMS, o hospital Einstein de SP, o Instituto do Cérebro do RJ e a Santa Casa de Maceió, não é efetiva contra a Covid-19 e causa sequelas. Sabe-se, entretanto, que Bolsonaro realiza dois eletrocardiogramas diários, prática totalmente inacessível para a imensa maioria dos brasileiros. Nos últimos 5 meses, o presidente da República submeteu os ouvidos da nação a considerações absurdas, como a de que atletas são resistentes ao vírus e brasileiros não se contagiam facilmente porque estão acostumados a mergulhar no esgoto, tentou na marra impor a sua vontade, tendo derrubado dois ministros da Saúde, médicos com muita credibilidade, por não se submeterem aos seus caprichos negacionistas. Inescrupulosamente, incentivou seus seguidores fanáticos a invadir os hospitais e violar o direito à saúde e a dignidade humana dos pacientes internados por Covid-19. Boris Johnson, líder conservador, remediou o seu mau comportamento inicial de negacionismo ao se internar e sentir que não era uma gripezinha. Pediu desculpas públicas. Se Bolsonaro vai se sair bem e explorar politicamente a doença e reafirmar o seu “histórico de atleta”, e que dá para todo mundo trabalhar e levar uma vida normal, mesmo contaminado, continuando com seu desdém com a pandemia, continuará mostrando a sua falta de entendimento do que seja a Presidência da República. Ele voltou a mostrar absoluta falta de empatia ao afirmar que a Covid “é como a chuva, vai molhar todo o mundo”, de forma que a morte seria inevitável, como se ela não pudesse ser evitada e protelada ao máximo, através de uma vida saudável e dos meios de atendimento à população mais carente. Bolsonaro é sinônimo de mau exemplo de um líder numa democracia nessa pandemia e a imagem brasileira no mundo é péssima, contudo, ele poderia seguir o exemplo de Boris Johnson, redimindo-se de sua atuação pífia e unindo os brasileiros nessa guerra da pandemia que está longe de terminar. Deveria mostrar se tem esse tamanho ou é menor do que o cargo de presidente da República. Bolsonaro tem uma segunda chance de fazer a coisa certa, oportunidade que chega para pouquíssimos afortunados. Sinceros votos para que saia dessa rapidamente e da melhor forma possível, que possa ressurgir aceitando e respeitando a ciência e com um mínimo de empatia e compaixão pelos 1,8 milhão de acometidos, pelas milhares de vítimas fatais e por seus sofridos parentes.

Mais matérias desta edição