Gazeta de Alagoas
Pesquise na Gazeta
Maceió,
Nº 5695
.

LIBERDADE DE EXPRESSÃO PODE SER REGULADA? .

.

Por Marcos Davi Melo - médico e membro da AAL e do IHGAL | Edição do dia 13/04/2024

Matéria atualizada em 13/04/2024 às 04h00

O exercício da liberdade de expressão foi construído no Brasil sobre os usuais trancos e barrancos que sempre acompanharam o reconhecimento de direitos individuais. A relação dos Poderes instituídos com a livre manifestação do pensamento, em especial quando exercida pela imprensa, sempre foi conturbada, o que não deixa de ser um sinal de que os jornais e revistas em geral cumprem bem sua missão de questionar as autoridades públicas.

Quase todos os regentes, imperadores, presidentes e ditadores nacionais andaram às turras com a liberdade de expressão. Nos tempos do Império, José Bonifácio organizava o empastelamento de jornais. Na República Velha, Floriano Peixoto defendia o arcabuzamento de quem defendia ideias contrárias à ordem vigente. Nos governos autoritários de Getúlio Vargas e dos militares, até “pensar em voz alta” era perigoso.

Nossa Constituição abraçou as liberdades, destacando em especial a proteção à liberdade de manifestação do pensamento, da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação. O Supremo Tribunal Federal (STF) foi instado por diversas vezes a definir os contornos da liberdade de expressão, como quando deliberou sobre a inconstitucionalidade da Lei de Imprensa, liberou a publicação de biografias não autorizadas, garantiu a exposição de publicações com temas homoafetivos e protegeu, em inúmeras oportunidades, o sigilo da fonte dos jornalistas.

Não há, contudo, prerrogativas absolutas, na lei ou na vida. A Constituição prevê, ao lado da liberdade de expressão, inúmeros outros direitos que devem ser exercidos com harmonia, garantindo-se o maior espaço possível de liberdade aos cidadãos. Quando tais direitos colidem, é preciso reduzir o âmbito de existência de cada um, de forma racional e ponderada, para preservar o exercício de ambos. É o que ocorre quando a expressão do pensamento afeta a honra, a intimidade ou a vida privada de terceiros, direitos também protegidos pela Constituição Federal.

Existem limites quando se trata de discursos de ódio, que incitam a violência ou a agressão. Nosso direito fixa os limites da liberdade de expressão nesse aspecto, ao criminalizar a incitação ao crime, a propaganda de fato criminoso. Em suma, garante-se qualquer manifestação, desde que não propague o ódio e a violência contra pessoas ou instituições.

Por mais paradoxal que seja, para preservar a tolerância é preciso ser intolerante com aqueles que propalam o fim das liberdades, mesmo que seja disfarçadamente como “defesa da liberdade de expressão”. É o Paradoxo de Karl Popper, que dizia ser necessário “exigir, em nome da tolerância, o direito de não tolerar os intolerantes”, do contrário “os tolerantes serão destruídos e a própria tolerância” com eles. As redes sociais não podem ser uma “Terra sem dono”, onde vale tudo e até estrangeiros abusam das fake news, atacam a nossa democracia e incitam o ódio contra autoridades brasileiras. A Câmara Federal precisa legislar urgentemente sobre a regulação das redes sociais. Basta se inspirar na Europa para fazer o que é indispensável e inadiável.

Mais matérias desta edição